ADERBAL FREIRE FILHO

 

ORFEU, SEMPRE -  “ Encenei, ao longo de toda minha carreira de diretor de teatro, cerca de 100 espetáculos. Ganhei praticamente todos os prêmios do teatro brasileiro (Molière, Mambembe, Shell, Golfinho de Ouro, APCA, etc) e – repito um ator de cinema americano que li por esses dias numa dessas resenhas de frases da imprensa – nem sempre mereci quando ganhei e muitas vezes deixei de ganhar quando provavelmente merecia. Assim são essas coisas, assim são os julgamentos. Tenho a tranqüilidade de dizer que poucas vezes me senti tão realizado e tão justificado enquanto artista de teatro como com o último espetáculo que criei, Orfeu. Em primeiro lugar por poder reviver um clássico do teatro e da arte brasileiros, obra do nosso poeta maior Vinicius de Moraes, com música de Tom Jobim, o extraordinário compositor. Ao lado da qualidade da peça, destaco um outro valor excepcional  da sua criação: o que ela significou para a projeção da raça negra, essencial na nossa cultura, no teatro brasileiro. Para dar a medida da importância histórica de Orfeu, vale ainda lembrar que os cenários originais foram criados por Oscar Niemeyer e o violão de Orfeu era tocado por Luis Bonfá.

A montagem de 2010 é igualmente ambiciosa. Ao meu lado conto com artistas de primeira grandeza. A direção musical do espetáculo é de Jaques Morelenbaum, um dos expoentes da música brasileira atual. Ao seu lado, Jaime Além, há 25 anos maestro e arranjador de Maria Bethania, não só co-diretor musical, como o magistral violão de Orfeu desta montagem.

Sem querer desmerecer os ótimos músicos que participam dos musicais nacionais, é impossível não destacar a qualidade e a importância dos músicos da nossa montagem. Ao lado de Morelenbaum e Jaime Alem, estão os destacados músicos Marcelo Bernardes, João Carlos Coutinho, Rômulo Gomes, Ronaldo Silva e Zero Telles.

O cenário de Marcos Flaksman, os figurinos de Kika Lopes, a luz de Maneco Quinderé, a coreografia de Carlinhos de Jesus: com esta equipe de criação os produtores mostraram que queriam voltar a esse clássico com uma produção do mais alto nível.

Deixo para o fim o essencial de um espetáculo teatral: o elenco. Algum jornalista me perguntou, na época dos ensaios, se não teria estrelas no elenco. Eu respondi que só teria estrelas. A confusão entre estrelas e celebridades da televisão é muito comum hoje e pena que ela influencie, talvez, os julgamentos mais diversos. Não tive em Orfeu atrizes e atores célebres da televisão. Mas tive em cena dezesseis estrelas.

Escolhidos em audições musicais rigorosas, convocados por um diretor que dedicou sua vida ao trabalho com atores e para atores, as atrizes e atores de Orfeu têm belas carreiras no teatro brasileiro. Érico Braz, Orfeu, é integrante do grupo Olodum, da Bahia; Jéssica Barbosa, a protagonista do filme Besouro; Pedro Lima, foi integrante por muitos anos do saudoso grupo Garganta Profunda; Patrícia Costa, tem vários musicais no seu currículo; Isabel Fillardis, que havia feito o personagem de Mira no filme Orfeu, de Cacá Diegues, aqui vive a Dama Negra; Wladimir Pinheiro, músico e cantor de reconhecido talento;  Eduardo Canto, com carreira premiada de cantor; Édio Nunes, outro ator e coreógrafo de musicais. Um elenco de estrelas, quase três meses de ensaios intensos, um espetáculo de teatro, teatro, teatro.

Como posso medir o êxito artístico da montagem, além de empenhar meu próprio testemunho, que diz que poucas vezes, em meus 40 anos de carreira, me senti tão realizado? Posso falar do entusiasmo da platéia do Canecão, excepcional nos três dias de ensaios abertos e na estréia. Da emoção e felicidade de Susana de Moraes, filha de Vinicius, comparando as duas montagens, a original e esta, com alegria. Testemunhos vários, enfim.

A consagração desse acontecimento artístico seria sua volta ao Teatro Municipal, onde a peça nasceu em 1956. Seria uma prova da força do teatro brasileiro, a prova de que, contra todas as adversidades, o teatro brasileiro tem história e essa história continua sendo escrita. ” ADERBAL FREIRE FILHO – Diretor


DIRETOR        

Aderbal Freire Filho distingue-se entre os diretores brasileiros por aliar a busca constante por novas formas de teatralismo a uma encenação que prioriza o ator como agente principal da linguagem e da comunicação das idéias do texto.Seu primeiro grande sucesso profissional é a direção do monólogo com Marília Pêra, Apareceu a Margarida, de Roberto Athayde, 1973.

Em 1979 dirige Crimes Delicados, de José Antônio de Souza, em Buenos Aires, quando inicia uma série de trabalhos que realiza periodicamente em países da América Latina - entre eles, Mefisto, de Klaus Mann-Arianne Mnouchkine; com a Comédia Nacional do Uruguai 1985/1986, resulta numa das suas encenações mais complexas; Egor Bulichov y otros, de Máximo Gorki, com El Galpón, de Montevidéu, 1987/1988; a ópera Simon Boccanera, de Verdi, também em Montevidéu, 1988. Na Holanda, dirige Soroco, Sua Mãe, Sua Filha, adaptado de Guimarães Rosa, com o Teatro Munganga de Amsterdã, em 1989.

Com Moço em Estado de Sítio, 1981, de Oduvaldo Vianna Filho, montado com jovens atores, inicia-se uma fase criativa em que o diretor associa a busca pela teatralidade a um processo de montagem que, com a participação do elenco, toma o texto teatral como eixo da criação.

Em 1983, dirige Besame Mucho, de Mario Prata, e leva os prêmios Paulo Pontes e Mambembe. Em 1984 encena Mão na Luva, novamente Oduvaldo Vianna Filho, com Marco Nanini e Juliana Carneiro da Cunha, levando dois Mambembes e o Golfinho de Ouro de melhor diretor.

No início da década de 90, dedica-se a personagens históricos, realizando: Lampião, do próprio Aderbal, voltado ao herói do cangaço, 1991; O Tiro que Mudou a História, dele e de Carlos Eduardo Novaes, sobre Getúlio Vargas, 1991; Tiradentes, Inconfidência no Rio, dos mesmos autores, sobre o conspirador mineiro, 1992.

Em 1995, encena Lima Barreto, ao Terceiro Dia, obra de Luís Alberto de Abreu, escrita dez anos antes; e Kean, adaptação de Jean-Paul Sartre da obra de Alexandre Dumas, novamente com o ator Marco Nanini. Em 1997, dirige O Carteiro e O Poeta, de Antônio Skármeta, sobre Pablo Neruda. A partir de então, passa a ser convocado para dirigir espetáculos com artistas globais.

Aderbal trabalha em todo o Brasil, faz montagens com grupos locais, dá cursos e dirige alunos de escolas de teatro. Sua prática na criação de espetáculos combina-se a um progressivo desenvolvimento de reflexões que dão origem a textos sobre teatro, a palestras e a oficinas. O ensino é uma atividade paralela presente na sua trajetória. Privilegia dramaturgos nacionais e latino-americanos, e dedica ao texto um minucioso estudo que, realizado em conjunto com os atores no processo da encenação, serve de alavanca à criação da linguagem de cada espetáculo. Percorre, ao longo da sua carreira, uma gama variada de linguagens e projetos cênicos, e caracteriza-se pela ênfase à função questionadora do processo de criação teatral.

Depois de dois espetáculos de sucesso absoluto sob sua direção:

Hamlet protagonizado por Wagner Moura no Rio de Janeiro e As

Centenárias com Marieta Severo e Andrea Beltrão em São Paulo,

lançou em 2009 sua versão de Moby Dick e estreou MacBeth com Daniel

Dantas e Renata Sorrah no Rio de Janeiro.

  

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O DISCURSO DO DIRETOR
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