RELEASE

CICLO INTERNACIONAL DE PALESTRAS

REÚNE PENSADORES EM TORNO DA POESIA



O sentido da série de conferências ( Antonio Cicero - direção e curadoria)

Vivemos numa época que – com a Internet, os computadores, os celulares, os tablets etc. – experimenta o desenvolvimento de uma tecnologia que tem, entre outras coisas, o sentido manifesto de acelerar tanto a comunicação entre as pessoas quanto a aquisição, o processamento e a produção de informação. Seria, portanto, de esperar que, podendo fazer mais rapidamente o que fazíamos outrora, tivéssemos hoje à nossa disposição mais tempo livre. Ora, ocorre exatamente o oposto: quase todo o mundo se queixa de não ter mais tempo para nada. Na verdade, o tempo livre parece ter encolhido muito.

De maneira geral, a fruição da poesia exige mais tempo livre do que a fruição de outros gêneros artísticos. Não precisamos nos concentrar numa canção ou numa pintura ou numa escultura ou na arquitetura de um prédio para que elas nos deleitem. Podemos apreciá-las en passant. Não é assim com um poema escrito. Quem lê um poema como se fosse um artigo de jornal, por exemplo, não é capaz de fruí-lo. Para apreciar um poema é necessário dedicar-lhe tempo. Numa época em que todos se queixam de falta de tempo, é evidente que sobram argumentos para aqueles que pretendem não haver mais, nos tempos modernos, lugar para a poesia: para aqueles que afirmam que a poesia ficou para trás; que foi superada pelos joguinhos eletrônicos, por exemplo.

Pois bem, penso o contrário. É exatamente nesta época de aceleração desembestada que a poesia mais se faz desejável. Com efeito, se praticamente não temos mais tempo livre, é porque praticamente todo o nosso tempo – mesmo aquele que se pretende livre – está preso. Preso a quê? Ao princípio do trabalho, ou melhor – inclusive, evidentemente nos tais joguinhos eletrônicos –, do desempenho. Não estamos livres quase nunca porque nos encontramos numa cadeia utilitária em que o sentido de todas as coisas e pessoas que se encontram no mundo, o sentido inclusive de nós mesmos, é sermos instrumentais para outras coisas e pessoas.

Alguns prazeres imediatamente sensoriais, como os gastronômicos, parecem fins em si próprios. Não nos esqueçamos porém de que a própria fruição dos objetos e/ou serviços – das mercadorias – que usamos para obter os prazeres sensoriais mencionados dificilmente escapa de ser instrumentalizável enquanto consumo conspícuo. 

Nada e ninguém jamais vale por si, mas apenas como um meio para outra coisa ou pessoa que, por sua vez, também funciona como meio para ainda outra coisa ou pessoa, e assim ad infinitum. Pode-se dizer que participamos de uma espécie de linha de montagem em moto contínuo e vicioso, na qual se enquadram as próprias “diversões” que se nos apresentam imediatamente.

Ora, precisamente a concentração que a poesia exige de nós representa o acesso a outra dimensão, a outro espaço-tempo, não só desvinculado dessa linha de montagem, mas incompatível com ela. A rigor, o poema não serve para nada. Por isso, ele esbanja o tempo do leitor ideal, que se deleita a flanar pelas linhas dos poemas que mereçam uma leitura ao mesmo tempo vagarosa e ligeira, reflexiva e intuitiva, auscultativa e conotativa, prospectiva e retrospectiva, linear e não linear, imanente e transcendente, imaginativa e precisa, intelectual e sensual, ingênua e informada.

O que pensa no poema não são apenas as noções correntes, mas também a materialidade linguística que o constitui: sua sonoridade, seu ritmo, suas rimas, suas aliterações etc., isto é, não apenas os seus significados, mas os seus significantes; e estes não se separam, no poema, daqueles.

Quem realmente deseje apreciar um poema deve deixar que em seu próprio pensamento interajam e brinquem uns com os outros, no tempo que para tanto se fizer necessário, todos os recursos de que dispõe: razão, intelecto, experiência, emoção, sensibilidade, sensualidade, intuição, senso de humor, memória, cultura, crítica etc. Quanto melhor o poema, mais recursos são por atualizados pelo seu leitor: e essa atualização mesma é a recompensa estética que o poema proporciona. Ela representa uma outra – mais poderosa – apreensão do próprio ser.

De todo modo foram semelhantes reflexões sobre o sentido da poesia no mundo contemporâneo que me motivaram a conceber uma série de palestras proferidas por alguns dos teóricos e/ou poetas que tenham pensado de modo profundo e original sobre essa questão.


A produção da série ( Gil Lopes - produtor )

Ver o célebre Tzvetan Todorov reverenciar Caetano lhe beijando a mão e ouvir dele que esse encontro era como se a Rainha da Inglaterra viesse vê-lo, já justificaria ter produzido a série de palestras Forma e Sentido Contemporâneo sobre Poesia. Episódios fortuitos e inesperados produzem estímulos intangíveis ao espírito do produtor, para o bem e para o mal. Uma crítica demolidora e injusta pode comprometer a longevidade de um espetáculo, gerar preconceitos insuperáveis, inviabilizar projeções, estimular maledicências, mas a recompensa projetada pelo encontro entre o fã e o ídolo é incomparável. Sua expressão é sempre imprevista, arrebatadora e comovente.

Depois de montar o musical Orfeu escrito por Vinicius de Moraes, apresentar um elenco de sábios escolhidos por Antonio Cicero discorrendo sobre a Poesia nos dias de hoje não deixa de ser uma tarefa de grande prazer que se integra e dá continuidade ao feito anterior.

Como uma chuva de leite bom na cara dos caretas, citando a canção do ídolo, a pretensão de encher a vida e a agenda das pessoas de poesia contrasta com a imposição tecnológica que conspira pela atenção integral e exclusiva dos seus artefatos. Não se trata de negá-los, mas de valorizar a dimensão humana avassaladora que a poesia resulta. Constitui-se também num esforço moral, no compartilhamento de um desejo de beleza, respeito e amor pela arte. Em resumo uma atitude prática frente às concepções redutoras que limitam o espaço e o alcance da poesia.

As comemorações octogenárias nos revelam que o maior artista brasileiro tem a mesma idade de Marjorie Perloff e Michel Deguy, ilustres intelectuais que nos visitam e que despertam a curiosidade de universitários ansiosos por reservar presença nas suas palestras. Num tempo onde a longevidade humana se apresenta cada vez mais auspiciosa é igualmente propício observar como os sábios são forjados e o quanto é fascinante a convivência com eles.  Assuntos instigantes e que tratam de outra ordem ou dimensão como a Poesia, são capazes de juntar palestrantes longevos e jovens fascinados numa cumplicidade altamente conspiradora.

A cultura, diferentemente da construção civil, não tem na intensa alocação de mão de obra a força da economia que gera, mas na sua capacidade de prover os indivíduos de compreensão do que são e do que podem ser para a redenção de seus desejos e aspirações. O Rio de Janeiro tem se destacado pela sua agenda, mas será o conteúdo dos seus eventos que lhe proporcionará o protagonismo. E a cultura no Rio de Janeiro pode se alastrar e ajudar a pensar o Brasil, assim como o mundo espera e observa qual será a novidade vinda do Brasil para além das nossas riquezas extrativas. Como dar melhor fim ao subsídio para produzir cultura senão o de adotar o critério do que pode nos transmitir esperança de viver melhor.


Forma e Sentido Contemporâneo-Poesia


No mundo contemporâneo, a tecnologia permite que a informação circule em volume e velocidade cada vez maiores pelos mais variados canais de comunicação. Paradoxalmente às facilidades conquistadas com estes avanços, a falta de tempo se tornou uma queixa recorrente. Neste contexto, a poesia teve sua morte anunciada por necessitar justamente deste tempo ‘inexistente’ para ser apreciada, por ser uma arte considerada incompatível com o ritmo frenético da vida moderna. Mas ao contrário do que o cenário pouco animador sugere, para o poeta, filósofo e ensaísta Antonio Cícero é justamente agora que a poesia se torna mais desejável. A tese foi o ponto de partida para a criação do ciclo de palestras ‘Forma e sentido’, que reunirá, no mês de junho, alguns dos maiores pensadores da atualidade para discutir o papel e o significado da poesia em nosso tempo. Ao longo de quatro terças-feiras, subirão ao palco do auditório do Oi Futuro – Flamengo para falar sobre o tema o historiador, lingüista e ensaísta búlgaro Tzvetan Todorov (7); a crítica literária norte-americana Marjorie Perloff (14); o poeta francês Michel Deguy (21); e o músico, professor e ensaísta brasileiro José Miguel Wisnik (28). Com realização e produção da Showbrás, o evento tem entrada gratuita, patrocínio Oi e Secretaria Estadual de Cultura do Rio de Janeiro, apoio da Revista Piauí, Jornal O Globo-Prosa e Verso, Universidade Federal do Rio de Janeiro, promoção Rádio Roquette Pinto.


Segundo Antonio Cicero, responsável pela curadoria, direção e apresentação do evento, “ao contrário do que supõe o senso comum utilitário dos nossos dias, a poesia dá acesso a um espaço-tempo desvinculado da verdadeira linha de montagem em que vivemos a maior parte da nossa vida. Ela torna possível uma outra – mais profunda – apreensão do próprio ser”. Cicero não ignora, porém, o caráter controverso de suas próprias ideias. Ao contrário: é no intuito de esclarecer, questionar e discutir, a partir de diferentes pontos de vista, o sentido da poesia que ele propõe abrir espaço para a manifestação de alguns dos críticos, teóricos e/ou poetas mais vitais e originais dos nossos dias.


Toda essa discussão, no entanto, não ficará restrita a quatro paredes. As quatro palestras – as três primeiras com tradução simultânea – serão transmitidas posteriormente pela internet (www.formaesentido.com.br). Todas as reservas para o evento estão esgotadas e quem garantiu presença no auditório fazendo a reserva através da Internet deve agora que se apresentar até às 19 hs. Depois disso os ingressos serão disponibilizados para a fila de espera no local.


Tzvetan Todorov


Nascido na Bulgária, o linguista, historiador e ensaísta Tzvetan Todorov, que vive na França desde 1963, é autor de cerca de trinta obras, repartidas entre muitos pólos de interesse. Por exemplo, Introdução à literatura fantástica (São Paulo: Perspectiva, 1975) e A literatura em perigo, (Rio de Janeiro: Difel, 2009), são estudos literários; Teorias do símbolo (São Paulo: Martins Fontes, 2003), Nós e os outros (Rio de Janeiro: Zahar, 1993), O jardim imperfeito (São Paulo: Edusp, 2005), Elogio do indivíduo (Paris: Adam Biro, 2000) e Os aventureiros do absoluto (Paris: Robert Laffont, 2006), cabem na rubrica de história das ideias; A conquista da América (São Paulo: Martins Fontes, 1984), O medo dos bárbaros (Petrópolis: Vozes, 2009) de 2008, tratam do encontro das culturas. Vinte e três dos seus livros já foram publicados no Brasil. Todorov se tornou inicialmente conhecido por sua brilhante elucidação e aplicação do método estruturalista à literatura e à crítica literária. Desde então, publicou vária obras de análise cultural e história das ideias. A obra literatura em perigo é especialmente importante para pensar sobre a leitura de poesia hoje, pois critica a tendência dos estudos literários contemporâneos a encarar os textos como meros pretextos para o exercício da análise estrutural. Ao proceder assim, a literatura, segundo ele, perde o seu sentido mais importante, que é o de nos fazer repensar, de modo mais rico e profundo, tanto o mundo em que vivemos quanto a nós mesmos.


Marjorie Perloff


A norte-americana Marjorie Perloff é crítica literária e Professora Emérita de Humanidades na Universidade de Stanford, e na Universidade da Califórnia do Sul. Ela tem uma notável reflexão sobre poesia e poética dos séculos 20 e 21. Entre seus livros se encontram A poética da indeterminação: de Rimbaud a Cage (Princeton: Princeton U. Press, 1981); O momento Futurista: Vanguarda, Avant-Guerre e a linguagem da ruptura, (Chicago: University of Chicago Press, 1984); Artifício radical: escrever poesia na época da mídia, (Chicago: University of Chicago Press, 1992); A escada de Wittgenstein, (Chicago: University of Chicago Press,1996); O modernismo do século 21, (Oxford: Wiley-Blackwell, 2002); O paradoxo de Viena, (New York: New Directions, 2004); Diferenciais: poesia, poética e pedagogia, (University of Alabama Press, 2005); e Gênio não-original: a poesia por outros meios (Chicago: University of Chicago Press, 2010). A obra de Perloff se dedica principalmente a discutir, defender e elucidar a poesia experimental e vanguardista. Ao fazê-lo, ela nos convida a retomar a intuição wittgensteiniana de que imaginar uma linguagem – que é parte do que os poetas experimentais pretendem fazer – é imaginar uma forma de vida. Perloff é especialmente ligada ao Brasil, em virtude dos importantes estudos que dedicou à nossa poesia concreta.


Michel Deguy


O poeta Michel Deguy fundou a revista Po&esie em 1977, e a dirige. Desde 2005, ele preside o Conselho de administração do Collège International de Philosophie. Deguy já publicou cerca de quarenta obras. Seus títulos recentes são: A razão poética, (Paris: Gallilée, 2000); Spleen de Paris (Paris: Gallilée, 2000); Sem retorno, (Paris: Gallilée, 2004); Desolatio (Paris: Gallilé, 2007); Reabertura após obras (São Paulo: Unicamp, 2010); O sentido da visita (Paris: Stock, 2005); A alegria pensativa (Paris: Belin, 2007); O Grande Caderno Michel Deguy (Paris: Le Bleu du Ciel, 2007); O fim no mundo (Paris: Hermann, 2009); e O estado da desunião (Paris: Galaade, 2010). Os poetas Marcos Siscar e Paula Glenadel, que já haviam traduzido o seu livro de poemas Rosa das línguas (São Paulo: Cosac & Naify; Rio de Janeiro: Viveiros de Castro Editora, 2004), acabam de lançar a tradução de Reabertura após obras (São Paulo: Unicamp, 2010). Deguy, que é hoje amplamente reconhecido como um dos maiores poetas franceses, tem a capacidade admirável de reunir a prática poética à reflexão filosófica.


José Miguel Wisnik


O músico e ensaísta brasileiro José Miguel Wisnik é livre docente em literatura brasileira pela Universidade de São Paulo.  Entre as seus principais livros encontram-se O som e o sentido – uma outra história das músicas (São Paulo: Companhia das Letras, 1989), Sem Receita – ensaios e canções (São Paulo: PubliFolha, 2004), Livro de Partituras (Gryphus, 2004), Veneno remédio – o futebol e o Brasil (São Paulo: Companhia das Letras, 2008) e Machado maxixe – o caso Pestana (São Paulo: PubliFolha, 2008). Ele recebeu inúmeros Prêmios, entre os quais dois Jabutis (1978 e 2009) e a Ordem do Mérito Cultural (2009). Wisnik tem atuado como conferencista convidado em diversas universidades do Brasil, da Europa e dos Estados Unidos, e como professor visitante na Universidade da California, em Berkeley. Compositor reconhecido e premiado, ele tem importantes parcerias com artistas como Tom Zé e Caetano Veloso. Nos últimos anos, tem desenvolvido o gênero “aula-recital”, em parceria com o violonista e ensaísta Arthur Nestrovski.


SERVIÇO:

Horário: retirada de reservas até às 19 h

Palestra: 19h30 às 20h30

Entrada franca

Local: Centro Cultural Oi Futuro (Rua Dois de Dezembro, 63 - Flamengo)

Telefone: (21) 3131.3060


www.showbras.com.br